segunda-feira, 17 de março de 2014

1964: o ano que não terminou

Por Joãozinho Ribeiro
Poeta e Compositor

O mês de março de 2014 será caracterizado pela realização de vários eventos políticos e culturais, que terão como objeto maior a reflexão e o debate sobre o golpe militar de 1964, que neste ano completa cinqüenta anos de existência. Golpe este que deixou cicatrizes profundas na sociedade brasileira e influenciou diferenciados posicionamentos políticos de muitas gerações, que até hoje permanecem encravados no país, e afloram nas disputas que giram em torno da escrita da história do Brasil e do poder político em suas múltiplas dimensões.

Em nosso estado, mas precisamente na capital, nesta quarta-feira, 19/03, no auditório da Faculdade de História (UEMA), localizada no Centro Histórico, às 18h00, acontecerá uma destas primeiras iniciativas, promovida pela Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz de São Luís. Trata-se do Projeto Quartas de Paz, que terá como tema central “REFAZENDO A HISTÓRIA E FAZENDO A MEMÓRIA – Março de 1964 – 50 Anos Depois”.

Nesta mesma linha, teremos o lançamento do livro “Travessias Torturadas – Direitos Humanos e Ditadura no Brasil (1964-1985)”, do jornalista potiguar radicado em Belém (PA), Dermi Azevedo, ex-preso político. Este evento é chancelado pela Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e integra a programação do Dia Estadual de Combate à Tortura, 22 de março, instituído em homenagem ao artista popular Jeremias Pereira da Silva – GERÔ. O lançamento acontecerá na Galeria Trapiche (Praia Grande, em frente ao Circo Cultural da Cidade), nesta sexta-feira (21 de março), às 15 horas.

Os dois eventos acontecem em momento bastante oportuno de reavivarmos a reflexão e o debate sobre vários personagens e instituições que com suas ações deliberadas e omissões envergonhadas foram artífices e/ou responsáveis por um dos episódios mais dantescos da história política do país, que resultou numa longa noite de escuridão cultural, pautada no terrorismo de Estado e na institucionalização da tortura, do exílio e do simples assassinato de presos políticos, como método deliberado do Estado para implantação de um regime de terror e de censura, aniquilando fisicamente pessoas, cujas ações e pensamentos eram contrários a orientação do regime ditatorial que tanto infelicitou nossa nação.

A respeito desta noite tenebrosa aqui denominada Golpe Militar, recomendo a leitura de um excelente texto recentemente publicado na internet, de autoria do Professor Emérito da Faculdade de Direito da USP e Doutor Honoris Causa da Universidade de Coimbra, Fábio Konder Comparato, intitulado “COMPREENSÃO HISTÓRICA DO REGIME EMPRESARIAL-MILITAR BRASILEIRO”.

Nele, o autor discorre com impecável fluência intelectual as razões históricas do golpe e o papel que tiveram instituições e entidades como a Igreja Católica e a FIESP no apoio ao golpe e ao regime militar que se implantaria no país, assim como o próprio financiamento da verdadeira máquina de tortura que se instalou no em terras brasileiras, contando com o apoio deliberado de várias entidades empresariais, responsáveis pela instalação e manutenção de verdadeiras casas do terror, onde muitos militantes de organizações políticas de esquerda, contrários ao regime, foram barbaramente torturados, com muitos pagando com a própria vida.

Na conclusão do texto, o professor Fábio Konder Comparato tece uma acirrada crítica ao modelo de democracia representativa vigente no ordenamento jurídico nacional, ao mesmo tempo que nos brinda com uma mensagem de esperança e fé no povo brasileiro, com a qual encerro o presente artigo:

“Enquanto persistir essa triste realidade, não ficará afastada a possibilidade de voltarem a ocorrer prolongados desmandos políticos, como o provocado pelo golpe de Estado de 1964.

Felizmente, a consciência pública começa aos poucos a se dar conta de que a única via de solução para esse impasse consiste em instituir no país um regime político de efetiva soberania popular, no qual haja a supremacia constante do bem comum do povo (a res publica romana) sobre todo e qualquer interesse particular, com controles permanentes sobre o exercício do poder em todos os níveis. Em suma, a criação de um autêntico Estado de Direito, Republicano e Democrático.


Para alcançar esse objetivo, o caminho é longo e penoso. Mas o que importa é começar desde logo a dar os primeiros passos, no sentido da defesa intransigente da dignidade do povo brasileiro”.

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