segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O que o Programa "Fantástico" não disse sobre o Maranhão.

Texto retirado da versão digital do Jornal Vias de Fato - www.viasdefato.com.br


O advogado Antônio Filho, ligado ao Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia (CDVDH), está ameaçado de morte por denunciar a violência, o crime e a impunidade tão comuns no Maranhão. Este assunto tem relação com a reportagem veiculada ontem (30/01) no Fantástico (TV Globo) sobre a situação das delegacias de polícia do Brasil.

A matéria citou o caso do fazendeiro Adelson Veras Araújo que vive em Açailândia e tinha ordem de prisão dada pela Justiça maranhense, desde abril de 2009, mas, até este mês de janeiro de 2011, não tinha sido preso pela policia do Governo de Roseana Sarney Murad.

Um absurdo! Um ano e nove meses depois da decisão judicial ele continuava solto, andando tranquilamente pelas ruas da cidade. O advogado Antônio Filho denunciou várias vezes esta situação. Por isto, ele está ameaçado de morte, tendo sido recentemente incluído no Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos (PPDDH) do Governo Federal. Estas informações não foram dadas pela matéria da Globo que também não citou o governo dos Sarney, que está evidentemente envolvido em mais este escândalo.

A TV não disse ainda que Adelson tem uma história de vida ligada ao trabalho escravo e “sua” fazenda está dentro de uma área de reserva ambiental protegida por Lei Federal, a Reserva Biológica do Gurupi. O inquérito policial concluiu que ele e várias outras pessoas, são responsáveis por dois homicídios e ocultação de cadáveres.

Vias de Fato esteve em Açailândia na semana passada. Foi acompanhar o lançamento do Atlas do Trabalho Escravo no Maranhão, livro que contou com a participação deste mesmo advogado Antônio Filho. Na ocasião, soubemos que a equipe da Globo (Fantástico) tinha estado na cidade e que a matéria com as barbaridades ocorridas no Maranhão deveria ter saído no domingo anterior (23/01) e não saiu. Segundo conseguimos apurar o Governo do Maranhão pressionou muito a direção da Globo para que a matéria não fosse veiculada.

Sem conseguir impor a velha e conhecida censura de sempre a oligarquia ganhou uma semana, informando a emissora dos Marinho que iria mandar prender o fazendeiro na sexta feira (28/01), o que de fato aconteceu.  A idéia foi tentar reduzir o escândalo, fazendo com que a matéria saísse depois que Adelson Veras Araújo fosse preso.

Mas, sobre este caso da prisão feita às pressas para não desmoralizar um governo que já nasceu desmoralizado, é provável que os advogados do fazendeiro preso entrem com um pedido de habeas corpus, para que ele seja colocado em liberdade o mais rápido possível.

É importante que as organizações populares, as redes sociais, a esquerda maranhense, os políticos e deputados verdadeiramente de oposição e o que existe de mídia livre no Maranhão, olhem com atenção este caso. Inclusive, apoiando e dando cobertura para as pessoas ligadas ao Centro de Defesa da Vida de Açailândia, que atuam nesta região que um dia foi batizada como Bico do Papagaio. 

domingo, 30 de janeiro de 2011

Corregedoria do TJ/MA é notificada sobre venda de terras a estrangeiro no Maranhão



Desde agosto do ano passado, quando o corregedor Antonio Guerreiro Júnior baixou o Provimento 08/2010, a Corregedoria Geral da Justiça recebeu a primeira notificação oficial sobre a venda de terras a estrangeiros no Estado do Maranhão.

A transação ocorreu em outubro de 2010, em Governador Edison Lobão (a 265 km da capital), e envolveu a compra de duas fazendas com áreas de 41,97,27 e 156,97,1 hectares, respectivamente, pelo comerciante espanhol J.C.G, casado. A Serventia Extrajudicial do Ofício Único de Governador Edison Lobão não informou o vendedor e o valor de cada negócio.

O envio do documento obedece ao que determina a Lei Federal 5.709, de 5 de outubro de 1971. De acordo com o artigo 11 dessa lei, os Cartórios de Registros de Imóveis devem remeter, a cada trimestre, à Corregedoria da Justiça dos estados a que estiverem subordinados e ao Ministério da Agricultura (INCRA) a relação das aquisições de áreas rurais por pessoas estrangeiras, sob pena de perda do cargo pelo titular da serventia.

Quando se tratar de imóvel situado em área indispensável à segurança nacional, a lista deverá ser remetida também à secretaria-geral do Conselho de Segurança Nacional.

A soma das áreas rurais pertencentes a pessoas estrangeiras – físicas ou jurídicas – não poderá ultrapassar a um quarto da superfície dos municípios onde se situem e será comprovada por certidão do Registro de Imóveis.

Sobre o assunto, o corregedor Guerreiro Júnior baixou provimento no qual determina a registradores de imóveis, tabeliães de notas e de títulos e documentos que observem rigorosamente a Lei 5.709/71 quando apresentarem ou tiverem que lavrar atos de aquisições e arrendamentos de terras rurais por empresas brasileiras com participação estrangeira. Da mesma forma, devem notificar a Corregedoria acerca de pessoas físicas brasileiras que abram firmas estrangeiras.

Os efeitos da Lei 5.709 devem ser estendidos a pessoas físicas brasileiras casadas ou em união estável com estrangeiro em comunhão universal de bens.

O corregedor acredita que a notificação da venda de terras em Governador Edison Lobão é reflexo do trabalho de fiscalização que Corregedoria realiza em todo o estado no sentido de identificar irregularidades em documentos e cartórios de registros de imóveis.

Em 2010, a Corregedoria detectou irregularidades na compra de terras por estrangeiros nos municípios de Barreirinhas e Turiaçu.

“Quanto a Barreirinhas, o relatório foi enviado ao Ministério Público estadual para que se manifeste. O relatório de Turiaçu está sendo finalizado”, informa Guerreiro Júnior.

AEB aprova licenciamento para atividades da Alcantara Cyclone Space


Agência designará equipe de acompanhamento das Atividades Espaciais de Lançamento do Projeto Cyclone 4
A Agência Espacial Brasileira (AEB) aprovou, por meio de portaria publicada na edição desta quarta-feira (26/1) do Diário Oficial da União, licenciamento para a execução de atividades espaciais para empresa binacional Alcantara Cyclone Space - ACS em seu sítio de lançamento situado na península de Alcântara - MA, nas dependências do Centro de Lançamento de Alcântara. As atividades estão permitidas pelo período de um ano.
Segundo a portaria, a AEB designará equipe de acompanhamento das Atividades Espaciais de Lançamento do Projeto Cyclone 4 com incumbência de elaborar relatórios técnicos.
A íntegra da portaria pode ser consultada em: http://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=13&data=26/01/2011
Por: Araújo
http://gaea-araujo.blogspot.com/

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O trabalho escravo no Maranhão e o Lançamento do ATLAS POLÍTICO-JURÍDICO DO TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO NO MARANHÃO

          Costumeiramente, o Estado do Maranhão é alvo de reportagens a nível nacional sobre a utilização de mão de obra de trabalhadores e trabalhadoras em condições análogas à de escravos. Este horrendo crime contra a humanidade (que tem suas origens desde os remotos tempos, e parece não querer que nos livremos dessa mácula) é previsto na legislação brasileira desde o começo do século XX. Atualmente, encontramos este fato tipificado no artigo 149 do Código Penal, in verbis:



Art. 149 - Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: 

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

         Nacionalmente, o Maranhão é o Estado brasileiro que mais exporta mão de obra escrava para todo o país. Milhares de homens e mulheres que não encontram nenhuma alternativa de trabalho nas terras de Gonçalves Dias, são obrigados a trabalhar em lavouras de cana no Sudeste, em carvoarias no Centro-Oeste ou nos garimpos do Norte do Brasil em busca de melhores condições de vida. Ao contrário de suas expectativas, encontram fome, sub-emprego, degradação humana.

        Além de ter o infeliz título de campeão de exportação de mão de obra escrava, o nosso querido Estado é o vice-campeão na famosa "Lista-Suja" do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Referida lista é um cadastro do MTE, no qual encontram-se os nomes de pessoas físicas e jurídicas que foram autuadas pela fiscalização federal. De acordo com a última atualização (26 de janeiro de 2011) do Cadastro de Empregadores (Portaria n. 540 de 15 de outubro de 2004), o Maranhão contava 22 nomes. Recorde histórico do Estado desde a criação da Lista.

        É nesse contexto que o Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia/MA lança no dia 27 de janeiro, o livro "ATLAS POLÍTICO-JURÍDICO DO TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO NO MARANHÃO".

           O Atlas do Trabalho Escravo será lançado na próxima quinta, 27/01. A obra é uma amostragem das informações que constam no acervo de arquivos do CDVDH e de  diferentes órgãos governamentais. Trata-se ainda de um analise e de um conjunto de dados sobre os processos envolvendo a prática do Trabalho Escravo em dezenas de fazendas no Estado do Maranhão.

         Com um conteúdo distribuído em 7 (sete) capítulos, o Atlas traz além de  um histórico da região sudoeste do estado do Maranhão, um estudo sobre as figuras dos peões “escravizados”, o patrão “proprietário de terras” e o gato “o aliciador”, personagens de destaque no processo de Trabalho Escravo; faz um analise das fiscalizações e de vários processos em andamentos na justiça; questiona porque  o ninguém está preso por este crime e avalia negativamente os dois planos criado pelos governos para erradicar este mal.

       No lançamento do Atlas estarão presentes, representantes do Poder Judiciário, de parlamentares federais e estaduais, membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MA, representantes da Secretaria Nacional de Direitos Humanos e do Provita,   e representantes do Ministério do Trabalho além de representantes de organizações da sociedade civil do Brasil e de outros países como a já confirmada presença do diretor da Agência Asturiana de Cooperação para o Desenvolvimento, Marcos Cienfuegos.  

        O lançamento acontecerá na quinta feira, 27/01 na sede do Centro de Defesa na Rua Bom Jesus, 576, Centro, Açailândia/MA. Mais informações no numero (99) 3538 2383.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Despejo Forçado na comunidade de Eugênio Pereira - Paço do Lumiar/MA

Retirado do Blog do Pedrosa: http://blog-do-pedrosa.blogspot.com/


A juíza de Comarca de Paço do Lumiar determinou o despejo da comunidade de Eugênio Pereira. Depois da tragédia do despejo da comunidade Menino Gabriel, a especulação imobiliária que se alastra nas imediações transformou a região num verdadeiro barril de pólvora. Leia o despacho judicial:

"Infere-se do relato constante no auto circunstanciado, elaborado pelo oficial de justiça, e das fotografias que o acompanham, que os requeridos, novamente invadiram a área objeto da presente ação possessória, em manifesta afronta à ordem judicial anteriormente exarada. Para o deferimento do pedido de manutenção ou reintegração de posse hão de restar configuradas a posse anterior da coisa pelo requerente, a prova de que os réus praticaram esbulho ou turbação e a identificação individualizada da coisa cuja posse é pretendida. Tais requisitos já se encontram configurados nos autos desde a decisão liminar de fls. 42/44, quando foi concedida a reintegração de posse. Ademais, existe nos autos prova robusta da ocorrência de nova invasão, também executada pelo mesmo grupo. Embora se trate de famílias carentes, não se pode consentir que a posse seja alcançada por meios ilegítimos, em detrimento do direito constitucional de propriedade de particulares, que mesmo não tendo caráter absoluto e exija o cumprimento da sua função social, não pode ser violado deliberadamente. A promoção da reforma agrária e a distribuição de terras para assentamento de moradias de pessoas carentes incumbe ao Poder Público e não pode ser obtida de forma ilícita. Diante desse cenário, determino a imediata expedição de novo mandado de reintegração de posse, pelos mesmos fundamentos da liminar anteriormente concedida, ficando de logo autorizado o auxílio policial, caso em que deverá ser a ordem cumprida com moderação, para evitar que confrontos e atos violentos sejam empregados. Determino ainda a CONDUÇÃO COERCITIVA das pessoas ocupantes da área, de preferências seus líderes conhecidos por Eugênio Pereira (o "Louro"), Ailton Pereira, Merly e outras eventuais lideranças, até a Delegacia de Polícia Civil, para que sejam identificados e devidamente qualificados por crime de desobediência, tipificado no art. 330 do Código Penal, já que descumpriram ordem judicial anterior, razão pela qual requisito a abertura de Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). Caso ofereçam resistência ao cumprimento da presente ordem judicial, autorizo, desde já, a prisão em flagrante de qualquer um dos requeridos ou invasores, com as providências legais cabíveis. Intime-se a requerente, por intermédio de seu advogado, para que tome ciência da presente decisão e para que informe, no prazo de 10 (dez), se tem interesse em produzir prova em audiência, no prazo de 10 (dez), dando cumprimento ao despacho de fl. 54 no mesmo sentido. Expeça-se o respectivo mandado. Dê-se ciência desta decisão ao Ministério Público Estadual."

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Números da política agrária e agrícola do Maranhão para 2011.


Nos últimos anos, o Estado do Maranhão vem apresentando um substancial aumento de sua receita corrente. No ano de 2006, estava na casa de 6 bilhões de reais. A previsão para este ano é de, aproximadamente, 9,7 bilhões de reais. O atual cenário econômico do país e a descoberta do Estado como o novo “eldorado” dos mega projetos de gás, petróleo, celulose, dentre outros colaboraram para esse substancial aumento.

No campo agrário, o Maranhão ainda engatinha em relação a outros Estados. Nunca é demais lembrar que o nosso Estado é o que apresenta a maior porcentagem de população rural do país: 37% dos habitantes do Estado residem na zona rural (segundo dados do Censo 2010 do IBGE). A evolução orçamentária, que será demonstrada a seguir, ainda não é capaz de dar as respostas necessárias aos reclamos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do Maranhão.

Segundo a Lei Orçamentária Anual (LOA), a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário (SEDAGRO) disporá do montante de R$ 14.691.696,00 (quatorze milhões seiscentos e noventa e um mil seiscentos e noventa e seis reais). Dentro da SEDAGRO, R$ 8.093.600 (oito milhões noventa e três mil e seiscentos reais) são destinados para a regularização fundiária e o fortalecimento da agricultura familiar.

O ITERMA (órgão fundiário estadual) tem previsão de gastos em 2011 na ordem de 7,5 milhões de reais. Observa-se que, segundo a especificação dos gastos apresentados no anexo da LOA, deste montante dos recursos, apenas 2,3 milhões será disponibilizado para a promoção da regularização fundiária e a criação e implantação de projetos de assentamentos rurais (objetos fins do órgão).  Ou seja: apenas 30,6% do orçamento do ITERMA será destinado à sua função institucional. Os outros 69,4% (aproximadamente) serão destinados ao funcionamento (pagamento de pessoal/contribuição à previdência do servidor público) e à manutenção da unidade. Vale lembrar que, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101), o Estado fica obrigado a gastar até 60% (sessenta por cento) da sua receita corrente líquida com gastos de pessoal (excluindo os gastos com manutenção).

Um dos pontos que mais impressiona na análise da LOA é a evolução do orçamento destinado à Superintendência do Núcleo de Programas Especiais (NEPE). Vejam quão impressionantes são os números. Em 2009, o valor destinado ao NEPE foi de 4,7 milhões; em 2010, 3,7 milhões; em 2011, o orçamento para a Superintendência foi de substanciais 46,7 milhões!  Dentro do valor destinado ao NEPE, R$ 44 milhões são destinados ao Programa de Redução da Pobreza Rural – PRODIM (Programa de Desenvolvimento Integrado do Maranhão). Este programa foi firmado no começo da década de 2000, com o Banco Mundial, para o combate à pobreza rural no campo, e encontrou grandes óbices para sua aprovação no Senado no ano de 2006.

Outros números que chamam a atenção. No orçamento da Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Pesca (SAGRIMA), também estão destinadas rubricas para o fortalecimento da agricultura familiar (e, sinceramente, não entendo porque essa divisão de recursos para os agricultores familiares entre a SEDAGRO e a SAGRIMA), na ordem de 6,179 milhões de reais.

Deste valor, apenas 500 mil reais (para mera comparação, este valor equivale a apenas um terço do prêmio do Big Brother Brasil) é destinado ao apoio ao agroextrativismo, em especial às quebradeiras de coco babaçu. Aos que bem conhecem este Estado, sabe-se que o extrativismo do coco babaçu é uma das forças que alavacam a (deficitária) economia rural do Maranhão, e destinar apenas 500 mil reais para este “apoio” é desconsiderar toda a importância desta cultura para as mulheres quebradeiras de coco do nosso Estado.

Uma boa ideia que começou a ser desenvolvida a partir dos anos de 1990 por diversas associações e organizações não-governamentais, e de modo ainda tímido, vem sendo incorporada pelo Poder Público, é a agroecologia. “Na agroecologia a agricultura é vista como um sistema vivo e complexo, inserida na natureza rica em diversidade, vários tipos de plantas, animais, microorganismos, minerais e infinitas formas de relação entre estes e outros habitantes do planeta Terra. Não podemos esquecer que a agroecologia engloba modernas ramificações e especializações, como: agricultura biodinâmica, agricultura ecológica, agricultura natural, agricultura orgânica, os sistemas agro-florestais, permacultura, etc.”[1] Mediante análise da LOA 2011 do Estado do Maranhão, percebemos que esse importante modo de produção rural, que alia o desenvolvimento das comunidades com a preservação do meio ambiente, ainda necessita de grande atenção. Apenas 610 mil reais estão alocados na rubrica “Implantação de sistemas produtivos agroecológicos”, da Agência Estadual de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural do Maranhão.

Se somarmos os valores destinados ao fortalecimento da agricultura familiar e reforma agrária distribuídos entre a SEDAGRO e a SAGRIMA, chegaremos ao valor de R$ 12.957.781,00 (doze milhões novecentos e cinquenta e sete mil setecentos e oitenta e um reais). Este valor corresponde, aproximadamente, a metade da quantia destinada à Secretaria de Estado da Comunicação Social (R$ 24 milhões), e um terço da quantia destinada à Secretaria de Estado do Turismo (R$ 35 milhões).

Esse parcos valores destinados à Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Estado do Maranhão ficam ainda mais irrisórios se compararmos com Estados com situação campesina semelhante. A título de exemplo, fazemos uma simplória comparação entre os orçamentos de 2011 do nosso Estado e do vizinho Piauí (Estado com a segunda maior população rural, perdendo apenas para o Maranhão).

Segundo levantamento preliminar do IBGE, no Censo 2010, o Maranhão exibe 36,93% de sua população morando (e trabalhando) na zona rural. O Piauí (nosso eterno “rival” nas mazelas sociais) apresenta 34,23% de sua população vivendo no campo. O mais impressionante vem a seguir. O orçamento geral (incluindo convênios, gastos com pessoa, manutenção, etc) da SAGRIMA, SEDAGRO e da Superintendência do NEPE totalizam R$ 127.289.579 (cento e vinte e sete milhões duzentos e oitenta e nove mil e quinhentos e setenta e nove reais). No Piauí, a Secretaria de Desenvolvimento Rural (que concentra toda a política fundiária/agrícola do Estado) dispõe de R$ 169.687.237 (cento e sessenta e nove milhões seiscentos e oitenta e sete mil duzentos e trinta e sete reais) para 2011.[2] Infelizmente não tivemos acesso aos valores específicos dos projetos e programas específicos de agricultura familiar e reforma agrária do nosso vizinho (e por isso a comparação com o orçamento geral).

A diferença de 42,3 milhões de reais em favor do Piauí pode, à primeira vista, até não ser tão vultuosa (lembrando que essa diferença é quase o orçamento total destinado ao NEPE/MA).  A questão fica delicada quando defrontamos esses valores com os orçamentos gerais dos dois Estados (Poder Executivo). O Maranhão dispõe de um orçamento geral de 6,3 bilhões de reais. O Piauí, de apenas 5,2 bilhões. Trocando em miúdos: o nosso Estado gasta 2,01% do seu orçamento com políticas agrárias e agrícolas, enquanto o nosso vizinho, 3,25%. Mesmo com uma população rural menor do que o Maranhão, o Piauí investe mais no homem do campo.

Portanto, podemos perceber claramente que, mesmo sendo o Estado que apresenta a maior porcentagem de sua população vivendo na zona rural, o Maranhão ainda não é capaz de executar políticas públicas efetivas para assegurar a permanência do homem (e da mulher) no campo.  O incentivo a mega-projetos no campo, aliados com a falta dessas políticas, tem expulsado os trabalhadores e trabalhadoras das suas terras tradicionalmente ocupadas e laboradas. Resultado?  Inchaço das cidades, falta de estrutura urbana, violência.

Neste interim, importante salientar que, segundo o Censo Agropecuário de 2006 do IBGE, 60% do que eu, você e toda a população brasileira colocam na mesa, é oriundo da produção de agricultores familiares e pequenas propriedades. É inadmissível que a grande maioria das frutas, legumes e cereais consumidos pelos maranhenses venha de outros Estados, mesmo aqueles sem nenhuma tradição no campo.

O Maranhão necessitada de medidas mais incisivas de fortalecimento ao pequeno trabalhador(a) rural e ampliação da reforma agrária. Só assim, cidade e do campo encontrarão a harmonia necessária para a boa convivência.


[1] Conceito obtido no endereço eletrônico: www.agroecologia.inf.br
[2] Valor constante na Lei n. 6037, de 30 de dezembro de 2010, disponível no sitio eletrônico do Diário Oficial do Estado do Piauí.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Daerle. Vítima de todos nós.

Daerle. Hoje, esse foi o primeiro nome que escutei no dia. E logo no primeiro nome, o primeiro aperto no coração.

Logo cedo, ao chegar no CCN/MA, ainda dentro do carro, fui abordado por Daerle. Pediu um pouco de café. De forma até um pouco ríspida, falei: “- ô papai, não tenho dinheiro aqui agora...” De imediato fui corrigido por Daerle: “Sou menina.” Pobre menina. Minha confusão com o sexo dela é, até certo ponto, compreensível. Corpo esguio, cabelo raspado, suja. Em momento algum Daerle parece ser uma menina prestes a entrar na adolescência. Insistiu no pedido do café, pois ainda não tinha se alimentado.  Antes de descer do carro, ela passou a mão na minha cabeça e disse: “Tio, você é tão bonito!”. Pena não poder dizer o mesmo de Daerle naquele momento, haja vista o estado degradante no qual se encontrava.

Desci do carro para saber um pouco mais sobre a vida daquela garota. Perguntei pela mãe. “Ela vive roubando. Prefiro pedir a roubar, tio.” Fiquei sem palavras, olhando para os olhos desesperançosos de Daerle. Após uma pausa, perguntei se estava na escola: "Não, tio. Eu não tenho documento para tá na escola". A última pergunta pareceu meio idiota, mas a fiz assim mesmo: "E seus tios, parentes, não tem?" A resposta foi um ríspido "não", com um inocente olhar para o asfalto. Continuou, afirmando que já tinha sido atendida por projetos da entidade.

Ao descer do carro, ela quis apertar a minha mão. Num gesto impensado de repulsa, recuei. Logo após pensei comigo: "Porque fiz isso?", questionava, como defensor de direitos humanos. Para tentar me redimir da burrada, coloquei a mão no seu ombro e convidei-a para ver se era possível tomar um café no CCN.

Enquanto Daerle se distraia com os jornais, questionei à coordenadora pedagógica do Projeto Sonho dos Erês se a entidade tinha conhecimento do caso dela, ao que me foi respondido que sim. Relatou-me a coordenadora que a menima Daerle já tinha sido atendida pelo referido projeto, mas que, infelizmente, não foi capaz de resgatá-la do sub-mundo das drogas, tendo em vista que ela, quando ingressou no projeto, já era usuária de drogas ilícitas. Crack, Merla, cola de sapateiro, ... Daerle não fazia distinção entre nenhuma delas para manter seu vício.

Fui informado ainda sobre a vida de Daerle. Estrupada aos 8 anos pelo padastro. A mãe, vai e volta, é levada para a penitenciária e delegacias em virtude de pequenos furtos para sustentar seu vício. Quando a mãe está detida, Daerle não volta para casa. Vive e dorme na feira do João Paulo. Segundo comentou com a coordenadora pedagógica do CCN, o padastro faz "saliência" e "mexe" com ela. O coração, mais uma vez, apertou.

O CCN, por diversas vezes, acionou o Conselho Tutelar da região. Em algumas ocasiões, a menina Daerle foi internada numa clínica para tratamento de dependentes químicos. Por falta de estrutura da clínica e de uma base familiar sólida, fugia constantemente, voltando para as ruas e para o vício das drogas.

Indignado com a situação de Daerle, entrei em contato com a promotoria da infância e da adolescência de São Luis, para as providências cabíveis. Tenho ciência que, mesmo encaminhado e realizado todo o procedimento adequado para atendimento de Daerle, muitas outras meninas e meninos continuarão dormindo nas feiras e ruas de São Luís, sujeitas à exploração sexual, à utilização de mão de obra infantil, e às drogas, caso não haja uma política pública incisiva de enfrentamento a essa questão.

A atitude de recuo que tive com Daerle demonstra o preconceito que achamos não ter. Por essas e outras, o processo formativo e de sensibilização de todos nós deve ser permanente.

Que Deus proteja Daerle, pois aos olhos do Estado e da sociedade, ela está suja, abandonada, drogada, violentada, invisível.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Pluviométrico Descaso, Trágico Ocaso

Não escrevo tão bem na prosa ou no verso: os meus estados de espírito, minhas sensações, estimas e afetos. Mas sinto, a lágrima quente descer silenciosa, escuto uma sístole, vejo lama, ouço os dramas: rolaram vidas, também camas, veio doída uma diástole, audiência trágica essa televisiva, repentina,triste fama anônima: mortos. vivos. mortos-vivos...agora ouço,dezenas estão desaparecidos, são 500 mortos!
Retumba acelerado sistole-diástole-lágrimas, sístole-diastole-lagrimas, 500 vezes. Não chego perto dos que ouvem, vem e sentem a sístole do Desabamento, a diástole de estar vivo, a salvo ou nos escombros, aguardando ansiosamente ser salvo, as lágrimas daqueles que perderam tudo, tudo mesmo, vidas construídas em famílias, lar e calma. 
Pensarás, ah! mais uma indignação...ano que vem tem mais...no sudeste ou no nordeste, tanto faz.. Era assim no início, agora e sempre, Amém! 

desabei e isso veio do coração à boca:

Vivos, em segundos mortos,
zune nos minutos das lágrimas,
há sobrevida por horas nos gritos dos escombros,
Das vidas que aguardam renascer na solidariedade,
sobreviver nas tragédias é a maior demonstração que a resiliência do brasileiro é testada todos os anos,
pelas transiçoes pluviométricas em perene descaso político.
 
 
*Escrito por Samira Mêrces dos Santos

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Seminário discutirá eventos de enchentes e secas no Maranhão


Iniciativa do Comitê de Monitoramento das Políticas Voltadas às Vítimas das Enchentes no Maranhão acontece quarta-feira no Sindicato dos Bancários

As enchentes que ora se abatem sobre o Rio de Janeiro não deviam ser tratadas como evento de emergência. Tragédia anunciada, leva a população, o poder público e os meios de comunicação a buscar culpados. As cenas de destruição – de moradias, cidades e vidas – vem se repetindo, ano a ano. E não são exclusividade carioca. Ou da Região Sudeste.

O Comitê de Monitoramento das Políticas Voltadas às Vítimas das Enchentes no Maranhão realiza, no próximo dia 19 de janeiro (quarta-feira), a partir das 8h, o Seminário “Maranhão no aperreio: a dificuldade do povo nos eventos de enchentes e secas”, no Sindicato dos Bancários (Rua do Sol, 413/417, Centro). Inscrições e maiores informações pelos telefones (98) 3231-1601 e 3231-1897 e/ou e-mail smdh@terra.com.br

O seminário objetiva discutir as perspectivas de preparação do governo para o já iniciado período de chuvas e suas consequências, assim como discutir os recorrentes eventos de secas e enchentes que se revezam anualmente, fragilizando cada vez mais a população do Estado, particularmente moradores/as das zonas rurais e periferias urbanas. O nome é inspirado no documentário Aperreio, de Doty Luz e Humberto Capucci, realizado a partir de encomenda do Comitê, com apoio da Oxfam, que também apoia a realização do Seminário. Aperreio foi recentemente premiado como melhor documentário, no Curta Carajás, no Pará.

Associação Agroecológica Tijupá, Cáritas Brasileira Regional Maranhão, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, MST e União por Moradia Popular estão entre as organizações que compõem o Comitê. Veja a seguir, a programação completa do seminário.

PROGRAMAÇÃO

Dia 19 de janeiro (quarta-feira)
8h30min – Abertura: boas vindas aos participantes e apresentação da proposta do Seminário (Representantes do Comitê de Monitoramento das Políticas Voltadas às Vítimas das Enchentes do Maranhão)
9h – Painel I: Cenários de mudanças climáticas (enchentes e secas) no
Maranhão e a previsão da atuação do Governo. Palestrantes: Márcio Eloi (Meteorologista do Laboratório de Meteorologia do Núcleo Geoambiental da Universidade Estadual do Maranhão), Cel. Marcos Sousa Paiva (Coordenador da Defesa Civil Estadual do Maranhão), Júlio César Correia (Superintendente da Defesa Civil de São Luís), Francisco de Assis Castro Gomes (Secretário de Estado de Desenvolvimento Social), Francisco José de Moraes Alves (Superintendente Estadual do Banco do Nordeste) e Conceição Andrade (Secretária Estadual de Desenvolvimento Agrário do Maranhão).
11h – Debate
12h – Intervalo: almoço
14h – Apresentação cultural
14h15min – Exibição do Documentário Aperreio
14h40min – Painel II: Perspectivas de atuação da sociedade civil frente aos próximos cenários de mudanças climáticas. Palestrantes: Elenita Almeida (Coletivo de Mulheres Trabalhadoras Rurais / Comitê de Monitoramento das Políticas Voltadas às Vítimas das Enchentes do Maranhão), Ermelinda Maria Dias Coelho (Fórum Maranhense de Segurança Alimentar e Nutricional), Raimundo César Martins (Fórum de Direitos Humanos do Maranhão) e Francisco Sales (Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Maranhão).
16h – Debate
16h30min – Planejamento do enfrentamento dos eventos climáticos em 2011 (Momento reservado às organizações que compõem o Comitê)
17h30min – Encerramento

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Veredas Destrídas

 * Transcrição da reportagem exibida no Programa Globo Rural, da TV Globo, do dia 09 de janeiro de 2011.
 
Izabel Maria Renosto, de Parauapebas, no Pará, ficou muito triste durante uma viagem na região leste do Maranhão ao ver a destruição das veredas para dar lugar ao plantio de eucalipto. Nossa reportagem foi ver de perto a situação e constatou que a preocupação de Izabel é também das comunidades tradicionais da região.
As veredas que Izabel Maria Renosto relatou ficam aqui na região do baixo Parnaíba, leste do Maranhão, e abrangem oito municípios. É uma área de mata nativa, típica do Cerrado brasileiro. As matas estão sendo derrubadas para dar lugar ao plantio do eucalipto.

Os pés de eucalipto vão ocupar uma extensão de 174 mil hectares. Uma parte dessas áreas pertence à empresa de siderurgia Margusa e a outra, à Suzano Papel e Celulose. Desde que as árvores nativas começaram a ser derrubadas, as comunidades tradicionais que vivem do cultivo de subsistência e do extrativismo do bacuri e do pequi estão preocupadas.

“Os correntões, quando passam, levam tudo. É também uma fonte de sobrevivência da gente, de tirar, de vender a polpa do bacuri. Nós não temos mais nada. Acabou. Está acabando com tudo e nós não sabemos o que fazer”, afirma Maria Lucia dos Santos Torres, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Urbano Santos.
A siderúrgica Margusa tem, no momento, um milhão de pés de eucalipto plantados que vão ser usados para carvão. O diretor vice-presidente, Leonídio Pontes da Fonseca, dá a posição da empresa. “Evidentemente, no que toca à Margusa, seus diretores não permitem, em hipótese alguma, que seus empreiteiros cortem madeiras que sejam protegidas pela lei em vigor”, diz.

A Suzano Papel e Celulose cultiva eucalipto no Maranhão há alguns anos, mas intensificou o trabalho nos últimos 18 meses devido à abertura de duas novas fábricas no Nordeste. De acordo com o projeto, vão ser cultivados 40 mil hectares de eucalipto, principalmente nos municípios de Santa Quitéria do Maranhão e Urbano Santos. Cerca de 40 famílias vivem no vilarejo rural de Ingá, no município de Urbano Santos. O antigo proprietário permitia à comunidade, além de explorar o bacuri e pequi, plantar também pequenas roças de milho, arroz e mandioca nas terras dele. Agora, a situação mudou. Os moradores reclamam que estão sem área para cultivar.

O lavrador José da Silva mostra a sua  plantação de mandioca. “A última que nós estamos plantando, colhendo, é essa aqui plantada que o senhor está vendo. Quando nós tirarmos essa daqui, nós temos que procurar outro lugar, que aqui nós não podemos mais plantar”, diz.

Outra reclamação das comunidades é quanto à retirada da água dos riachos para irrigar as plantações de eucalipto. Em um vilarejo, em Santa Quitéria do Maranhão, 65 famílias reagiram para proteger o riacho Boa Hora.

“É cada um de nós, um ou dois ou três, vigiando, para quando eles passarem, para ver se eles se eles estão tirando ou não. E onde ele estiver tirando, nós temos que nos juntar e chegar até lá e dar um jeito: aqui vocês não vêm mais”, diz o trabalhador rural Djalma Coimbra dos Santos.

A diretoria da Suzano Papel e Celulose não quis gravar entrevista, mas informou, por meio de nota, que cumpriu todas as determinações necessárias para conseguir as licenças de uso da água dos riachos. Nas situações em que alguma comunidade impediu o uso da água, a empresa disse que conversou com os moradores e que quase sempre conseguiu a liberação. A Suzano explicou ainda que entende e respeita a preocupação dos sertanejos e que sempre irá buscar opções operacionais que não comprometam as relações com a comunidade.

As licenças ambientais foram concedidas pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, mas o Ministério Público Federal no Maranhão contestou na justiça essas licenças.

“Nós entendemos que o empreendimento tem um impacto regional, que atinge mais de um estado. Atinge o estado do Maranhão, o estado do Piauí, ou pelo menos o rio Parnaíba que separa os dois estados, e que, por conta desse potencial de causa de impactos regionais, ele deve ser, na verdade, avaliado por uma entidade, digamos assim, que tenha atribuição nacional. No caso, o Ibama”, afirma Alexandre Soares, procurador do MPF.

Na primeira instância, na Justiça Federal no Maranhão, o Ministério Público Federal perdeu a causa, mas o procurador Alexandre Soares recorreu da decisão e agora o processo corre no Tribunal Regional Federal da Primeira Região, em Brasília.

Vídeo:
http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM1406808-7823-VEREDAS+DESTRUODAS,00.html

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Despejos forçados de Fim e de Começo de Ano.

* Artigo escrito por Luis Antonio Câmara Pedrosa, retirado do Blog do Pedrosa (http://blog-do-pedrosa.blogspot.com/)
Após o despejo forçado de 48 famílias da comunidade da Ilhinha, na Vila Maranhão, pela MPX, o Tribunal de Justiça ainda nos brindou com a suspensão da liminar que protegia de um iminente desastre a comunidade do Novo Angelim.

A comunidade do Novo Angelim passa por por um processo de expulsão lenta e gradual, por força da implantação de um empreendimento da empresa API SPE 20 – PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS, nas vizinhanças do tradicional restaurante Chico Noca.

As obras de terraplanagem desencadeadas pela empres gradual e afrontosamente soterram a comunidade, que não tem mais sequer via de aceso para suas moradias. A Defensoria Pública ajuizou ação civil pública para obrigar o empreendendor a construir um muro de contenção, de modo a impedir a entrada de grande volume de barro para dentro das residências, no que foi atendida pelo juiz de primeiro grau.

 API SPE 20, insatisfeita, recorreu da decisão, e o relator do processo, desembargador Jamil Gedeon, resolveu suspender a medida liminar concedida. Transcrevo abaixo trechos da decisão do desembargador, um verdadeiro monumento à violação ao direito humano à moradia:

"Vê-se, portanto, que, com as obras de contenção, a vida e a segurança dos moradores do assentamento já estão sendo preservadas. Não se pode exigir, contudo, que a empresa agravante recue o muro, deixando de executar em terreno comprovadamente seu empreendimento imobiliário por ela projetado para que seja respeitada uma servidão de trânsito não regularizada, supostamente existente em terreno de área de preservação ermanente, ou seja, em que nem sequer poderia existir o assentamento. Imaginar-se o contrário significaria flagrante afronta ao direito de propriedade, constitucionalmente previsto.
3. Conclusão Ante o exposto, concedo o efeito suspensivo pleiteado, sobrestando os efeitos da decisão recorrida até pronunciamento definitivo do órgão colegiado, a fim de que a construção do muro de contenção possa ter continuidade, sendo desnecessária a observância dos limites impostos pelo Juiz de 1º Grau."

A comunidade do Novo Angelim está no local há mais de quarenta anos e até então nunca fora molestada por pretensos proprietários. Se a comunidade está em Área de Preservação Permanente, porque os órgãos ambientais e municipais concederam autorização para a empresa soterrar o antigo igarapé e os juçarais da localidae? Para morar, não, mas para rico ganhar mais dinheiro pode?

Fizemos uma visita ao local, acompanhados pelo relator da plataforma Dhesca para Moradia Adequada, e constatamos que a empresa já haiva, por conta própria, aterrado o único poço de água potável da comunidade e demolido uma residência.Os limites para a construção do muro, se referem a apenas cinco metros de distância das residências, estabelecidos pelo juiz de primeiro.

A empresa quer construir o muro praticamente em cima das residências, para forçar as pessoas abandonarem a área.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Prainha do Canto Verde - a experiência do Turismo Comunitário no Ceará

Depois de duas sabáticas semanas pelo litoral nordestino, volto a postar no blog. E relato aqui uma experiência deste fim de ano que recomendo a todos que façam o mesmo.
Passei cerca de 36 horas na comunidade da Prainha do Canto Verde, localizada no município de Beberibe, distante 120 quilômetros de Fortaleza, no Estado do Ceará. A comunidade integra uma rede de turismo comunitário, chamada “Rede Tucum” (www.tucum.org), composta por várias outras comunidades tradicionais do litoral cearense, com o intuito de desenvolver o turismo e fortalecer a luta pelos recursos naturais para aquelas famílias, que por décadas residem naquelas terras. Tal iniciativa tem, como um dos objetivos, romper com a lógica dos grandes resorts (que proliferam pelo nosso litoral), que expulsam as pessoas de suas terras e destinam os lucros, muitas vezes, para fora do país.
Hoje, a comunidade é uma Reserva Extrativista. Ainda assim, pretensos proprietários tentam anular, na Justiça Federal do Ceará, o ato de criação da Reserva, alegando serem donos de metade da área da comunidade (que conta com 250 famílias). Tem por intenção venderem a terra para um grupo espanhol implantar um grande resort.
Cheguei na comunidade por voltas das 21 horas do dia 26 de dezembro. Já estavam à minha espera o Sr. João e a Dona Aíla, proprietários da pousada Sol e Mar. Depois de mais de 14 horas dirigindo pelas estradas, tudo o que eu mais queria era uma boa cama para descansar e dormir. O quarto, muito simples mas extremamente limpo e confortável, era o refúgio preferido naquela hora. O forte e permanente vento que sopra no litoral cearense me fez dormir um sono dos anjos, mesmo num quarto sem aparelho de ar-condicionado ou ventilador.
Os primeiros raios de sol do dia 27 do último mês do ano incidiam pelas frestas da porta do meu quarto. Nada como começar o dia como uma bela caminhada à beira-mar. As primeiras jangadas partiam rumo ao oceano em busca do sustento de cada dia.
A manhã foi dedicada a sentar na beira da praia, admirar as jangadas no mar, bater um papo com os amigos e tomar uma cervejinha gelada. Por volta do meio dia, a parte mais “radical” do dia. Entrei na pequena jangada e partirmos oceano adentro. A sensação é de andar sobre o mar. A dois quilômetros da costa, a jangada parou e um mergulho numa água quente e de um verde ofuscante foi algo obrigatório.
Depois de um peixe assado na brasa e um bom pirão feito por Dona Aíla na Pousada Sol e Mar, partir para a Trilha Ecológica com o Luís, guia local. No roteiro, a marcenaria da comunidade, que produziu catamarãs (detalhe: com orientação de um profissional maranhense!) e constrói jangadas e móveis para as famílias que residem na Reserva Extrativista. O entardecer se deu na Lagoa do Córrego do Sal. Paisagem de tirar o fôlego. A noite, um papo com os locais sobre a história da comunidade fechou o dia.
Experiências como a da Rede Tucum (que conta com o apoio do Instituto Terramar) e da comunidade da Prainha do Canto Verde demonstram que é possível conciliar o desenvolvimento das comunidades tradicionais e do turismo que não desagrega os valores sociais e não depredam o meio ambiente. Mais uma lição para o Maranhão. Como diz no endereço eletrônico da Rede Tucum, viva essa experiência!