Por Bianca Pyl
Entre os questionamentos feitos aos resultados da Rio+ 20,
um dos mais relevantes é o fato de o documento oficial – “O Futuro Que
Queremos” – não levar muito em conta as contribuições dos modos de vida das
comunidades e dos povos tradicionais como instrumento na luta contra as
mudanças climáticas. O modo de vida dessas populações – de respeito ao meio
ambiente e consumo sustentável dos recursos naturais – pouco influenciou o
documento da ONU. Os líderes mundiais, principalmente das nações mais ricas,
não abrem mão do crescimento contínuo.
Pequenos agricultores, pescadores e pescadoras artesanais,
quilombolas e indígenas muitas vezes não participam das tomadas de decisões
relativas ao meio ambiente, e no evento realizado este mês no Rio de Janeiro
não foi muito diferente. Mesmo sem muito espaço para incidir no debate, são
estas comunidades que sofrem diariamente as consequências das mudanças do
clima.
Pensando nisso, o Programa Direito a Terra, Água e
Território (DTAT) viabilizou que cinco comunidades de diversas regiões do país
e localizadas em quatro biomas diferentes avaliassem os riscos climáticos que
vivem e também planejassem ações de mitigação e adaptação às mudanças do clima.
A avaliação foi realizada no processo de adaptação da Metodologia de Avaliação
de Riscos Climáticos (CLIDES), desenvolvida pelas organizações Suíças HEKS e
Pão Para Todos. “O debate sobre a crise
ambiental pode colocar outras vozes na cena pública, que são ocultadas ou
consideradas atrasadas”, afirmou Cristiane Faustino, do Instituto Terramar,
entidade que integra o Programa DTAT no Ceará.
Para ela, a chamada economia verde e o investimento tecnológico não são as
únicas propostas que podem contribuir para reverter os grandes problemas
ambientais enfrentados hoje. “Podemos
aprender e encontrar soluções nas formas de vida destas comunidades”,
lembrou. O modelo de desenvolvimento que expropria e expulsa as comunidades de
seus territórios é o mesmo que compra ativos florestais, via mercado de
carbono. “A contribuição das comunidades
é, principalmente, na luta política por mudanças globais. O DTAT trabalha para
que estas comunidades não estejam fora deste processo”, afirma Augusto
Santiago, da CESE, que coordena o Programa.
Os encontros nas comunidades buscavam a adaptação da
metodologia para as condições socioambientais brasileiras, levando em conta as
diversidades dos biomas. “A metodologia
nos ajuda a fazer uma releitura deste tema, que é amplo, relacionando-o com a
vida cotidiana”, opinou a integrante do Terramar. Os encontros foram
realizados com apoio da agência holandesa ICCO e da Embaixada Suíça no Brasil.
Os principais problemas percebidos pelas famílias estão
relacionados à estiagem, ao aumento do calor, avanço do mar e mudanças nos
ciclos de chuva. Os participantes também relataram a perda da diversidade de
sementes. No semiárido, a intensificação da seca por períodos mais longos
preocupa as comunidades. Já na Mata Atlântica e na Amazônia, a alternância de
grandes secas com períodos de chuvas acima do normal estão entre as diferenças
relatadas.
De acordo com Sebastião Silva Pereira, da comunidade
quilombola Barro Vermelho, que faz parte do Fórum em Defesa do Baixo Parnaíba,
foi muito importante trabalhar o tema dentro da comunidade. “É preciso mudar a forma de lidar com a terra
e com a biodiversidade da nossa região para não degradar o meio ambiente. A
metodologia facilitou trabalhar com o tema dentro da nossa realidade”.
O mais importante para Nair Martins Barbosa, da Sociedade
Maranhense de Direitos Humanos, foi perceber que a comunidade conseguiu ligar
os pontos entre causas e consequências, como enchente e seca, com os problemas
globais. “O mais importante foi o
despertar para estes riscos que estão tão próximos e eles descobrirem que podem
ser agente de mudanças no âmbito local”.
Sobre o Programa DTAT
O Programa DTAT, composto de 13 organizações brasileiras que trabalham pelo
acesso de povos tradicionais aos seus territórios ancestrais, promoveu
encontros sobre o tema com o objetivo de que os conhecimentos das comunidades
tenham incidência nas decisões tomadas em espaços públicos. Além disso, foram
realizados eventos para explicar a metodologia, cuja aplicação também foi
apoiada pelo programa em todas as comunidades. Todo o processo recebe apoio da
ICCO, agência Holandesa de cooperação e da Embaixada Suíça no Brasil.
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